GCAD_Ritmos, entreténs…

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GRANDE CANCIONEIRO DO ALTO DOURO – RITMOS, ENTRETÉNS, LENGALENGAS…
[GCAD VOLUME III - pgs  1.867 > 1.882] 

EXEMPLOS [GCAD, Pg. 1.867]

Assim, outro aspecto que tem de ser referido diz respeito à total ausência de comunicação escrita e, muito menos, áudio-visual. E, na província de Trás-os-Montes e Alto Douro, ainda agora não chega toda a comunicação social escrita e, quanto às novas tecnologias, existem ainda muitas e grandes zonas mortas para os telemóveis, a internet e, até, a televisão (e cabo só por satélite) e a rádio. [Escrito em 2008]
Teremos de nos situar em épocas em que as horas de leitura de livros e jornais, rádio e, sobretudo, as muitas horas diárias de televisão (estatisticamente são 3 horas cada pessoa, na actualidade) eram passadas a trabalhar, ou em convívios com familiares e amigos. Quer no trabalho, quer em casa, quer com amigos, falava-se ou dialogava-se muitíssimo mais do que actualmente e a transmissão de vivências e saberes realizava-se de forma, por regra, informal e inconsciente.
Assim, grande parte dos processos de aprendizagem (e diversão) passavam pelo convívio pessoal e empático, interactivo, mas sem intervenção exterior e, ainda, sem escolas nem mestres.
A tradição oral baseia-se em fórmulas rimadas e também em ritmos próprios, nem sempre rimados, que possibilitam a transição das memórias através dos séculos, sem serem escritas.
A título de curiosidade, apresento uma listagem de descobertas que o progresso pôs diante da Humanidade em pouco mais de… 50 anos – meio século – e ficamos admirados com a sua quantidade e qualidade [Escrito em 2008]:
– televisão,
– vacinas contra a poliomielite,
– comidas congeladas,
– fotocopiadora,
– lentes de contacto,
– radares,
– cartões de crédito,
– raio laser,
– patins on-line,
– ar condicionado,
– máquina de lavar,
– secadoras (as roupas simplesmente secavam ao vento),
– o homem nem havia chegado à lua,
– rapazes não usavam piercings,
– computador,
– duplas carreiras universitárias,
– terapias de grupo,
– fast food, ou “comida rápida”,
– telefones sem fio (muito menos telemóveis),
– música estereofónica,
– rádios FM,
– fitas K-7,
– CDs,
– DVDs,
– máquinas de escrever eléctricas,
– calculadoras (nem as mecânicas quanto mais as portáteis),
– “Notebook” era um livreto de anotações,
– relógios a pilhas,
– tecnologia digital,
– indicadores com números luminosos,
– rádio-relógios-despertadores,
– máquinas de jogos,
– cafeteiras automáticas,
– micro-ondas,
– videocassetes,
– câmaras de vídeo,
– As fotos não eram instantâneas nem coloridas (somente p/b e a revelação demorava mais
de três dias.
– As fotos a cores não existiam (e, ao aparecerem, a revelação era muito cara e demorada),
– Se em algo lêssemos “Made in Japan”, era de pouca qualidade,
– não havia “Made in Korea”,
– nem “Made in Taiwan”,
– nem “Made in China”,
Não havia também:
– “Pizza Hut”,
– “McDonald’s”, Zara, Corte Inglês
– café instantâneo,
– gelados, passagens de autocarro, refrigerantes, tudo por 10 centavos,
– “erva” cortava-se para os animais (e não para se fumar),
– Não havia “hardware” e “software”,
– nem pílula anticoncepcional,
– a virgindade não ‘produzia cancro’,
– e uma senhora precisava de um marido para ter um filho.
(Autor desconhecido)

Sem esta panóplia de inventos, que hoje até já consideramos primitivos e obsoletos, quer as crianças quer os adultos podiam dar largas à sua imaginação e espírito criativo, para inventarm brinquedos e reinventarem maneiras agradáveis e (sempre) instrutivas de utilizar o tempo.
Seria mais adequado dizer que antigamente se inventava o Tempo.
De facto, já se vão perdendo nas brumas da memória os costumes individualizados com que as crianças eram criadas e educadas. Mas, embora em grau estatisticamente cada vez mais diminuto, ainda vai havendo famílias, em que, para as crianças, as mães e avós ainda vão buscar coisas bonitas e eficazes às arcas da memória, geradora de saudades, de sonhos e de música interior.
Os ritmos familiares dos gestos quotidianos contribuem para o crescimento fisico e psíquico dos homens e mulheres do Futuro, que cada vez mais está descaracterizado, massificado e depressa calcinado, pois os sonhos não lançam raízes no cimento.

ENTRETÉNS
Como ensina o Dr. Joaquim A. Ferreira, excelente pedagogo e investigador regionalista (Vila Real), a actividade lúdica é essencial para o desenvolvimento integral e harmonioso da psico-motricidade da criança. Como não o pode fazer por ela própria, vão  aprendendo com as mães e os familiares, que desempenham essa função utilizando gestos, palavras (geralmente rimadas e ritmadas) e canções apropriadas.
Daí nasceram os entreténs, que têm um grande valor físico, psíquico e pedagógico, pois auxiliam poderosamente a criança a crescer mais sã, a aprender mais cedo, a exercitar as suas actividades corporais e a desenvolver mais rapidamente as suas
faculdades mentais.
Eis alguns exemplos dessas actividades:

Para divertir as crianças
Bichinha gata,
Que vens tão farta,
Que comeste hoje?
Sopinhas de leite.
Gardaste-me delas?
Gardei, gardei.
Adonde?
Atrás da caixinha.
Com que a tapaste?
Com o rabo do gato.
Sape, gata, para casa da
madrinha.
Comer pão sardinha.

Dizem-se estes versos ritmadamente, afagando com as mãos o rosto da criança, correspondendo a cada verso um movimento descendente. Os últimos dois versos são acompanhados de cócegas no peito, ou pancadinhas no rosto.

Bichinha gata,
Donde vens tão farta?
De casa da madrinha.
Que te deu ela?
Pão e sardinha.
Sape gata, prá cozinha.
*
Bichaninho gato,
Donde vens tão farto?
De casa do tio Marto.
Que comeste lá?
Sopinhas com mel.
Sape, rabeja,
Pra casa do ti Miguel.
*
Foste à vila?
Fui.
Compraste panelas?
Comprei.
Quebraste-as pelo caminho?
Quebrei.
A tua mãe ralhou?
Ralhou.
Vamos também nós ralhar?
Vamos.
Depois, bufam na cara um do outro:

_________

Para adormecer
O menino mau
Tem o cu de pau.
Não quer ir prà cama,
Mas leva tau, tau,
*
Papão, papão, vai-te embora,
Lá de cima do telhado.
Deixa dormir o menino
Um soninho descansado.
*
Nana, nana, meu menino,
Que já lá vem o Tutu,
Com um cacho de bananas
E um prato de peru.
Nana, nana, meu menino,
Que a mãezinha logo vem.
Foi levar os cueirinhos
À fontinha de Belém.
*
João Pestana, João Pestana,
Faz dormir o menino
na cama.
Para mamar
Rola, rola, catrapula,
Que te quero dar a mama.
O teu pai foi pró moinho,
Tua mãe ficou na cama.
*
Palmadinhas, palmadinhas,
Palmadinhas e palmocas.
A mãe dará maminhas,
A mãe dará mamocas
E o papai, quando vier,
Te dará o que trouxer.
*
Palminhas,
Palminhas,
A mãe dá maminhas
E o pai, quando vier,
Dará do que trouxer.
Para comer
Enganei-te, enganei-te,
Com as sopinhas de leite,
A comer uma cereja,
À porta da nossa igreja.
Ó Zé , põe-te a pé,
Vem tomar o teu café.
Tim, trelim, meu cafezinho,
Tim, trelim, eu vou tomar.
Só me dói a barriguinha,
Quando é para trabalhar.
*
Põe, põe, pitinha o ovo,
Que a menina papa o todo.
Ela o coze, ela o assa,
Ela o vai vender à praça.
*
Faz um bolinho
Pró meu manquinho.
Quem o mancou?
Foi um a velha
Que aqui passou.
*
Acabou-se a papa doce,
Quem a comeu
regalou-se.
Para por no chão
Cadeirinha, cadeirão,
Sapatinho de algodão,
Leva o bebé à mãezinha
Que lhe dará a maminha,
Se o menino for pró chão.
*
Orelhita purigenha,
Onde vais buscar a lenha?
À ribeira da canhota,
Onde a lenha é mais torta.
Roça, roça no chão, roça,
Vai pró chão andar de gatas,
Mas não rompas as sapatas.
Para andar
Mão, mão, mão.
Pé, pé, pé.
Roda, roda, roda,
Caranguejo peixe é.
*
Chi coração,
Caixa de pão,
Pipa de vinho,
Para o menino
Ir à lição.
Dá cá a mão.
Para contar
Tu tens uma bonequinha?
Tenho.
Ela é engraçadinha? É.
Quantos anos ela tem? Cinco.
Vamos lá contá-los:
Um, dois, três, quatro, cinco…
*
O teu pai fez uma casa? Fez.
Quantos pregos lhe pregou?
Dez.
Vamos lá então contá-los:
Um, dois, três, quatro, cinco,
Seis, sete, oito, nove, dez.

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LENGALENGAS
Se as crianças se divertiam com os entreténs e os jovens com os jogos, os adultos também podiam entrar no grupo, sobretudo nos jogos das palavras, uma brincadeira
que não foi apanágio exclusivo da literatura oral, mas que entrou também na literatura escrita, atingindo o seu ponto mais alto na escola gongórica, no século XVII. E foi
assim que surgiram as lengalengas, em grande quantidade, das quais deixo alguns exemplos muito curiosos e bem significativos. (Outras lengalengas: no Vol II)

Aos dedos da mão
a.
Este é o mindinho,
Este é o vizinho,
Este é o pai de todos,
Este é o fura bolos,
E este o matraca-piolhos!
b.
Este foi à lenha,
Este o ajudou,
Este achou um ovo,
Este o cozinhou
E este o papou.
c.
Este diz que quer pão,
Este diz que não lho dão,
Este diz que o vai ganhar,
Este diz qe o vai roubar,
E este diz que roubar não,
Porque é feio e dá prisão.
d.
Ana, Magana,
Rabeca, Susana,
Lázaros, Ramos,
E na Páscoa estamos!

Aos dias da semana
a.
Os dias que há na semana

Eu tos vou a referir,
Com palavras excelentes,
Escuta, se queres ouvir:
Segunda-feira, águas claras,
Que regam toda a verdura,
Pra alegrar esses teus olhos,
Amor de pouca ventura.
Terça-feira, alecrim verde.
Bem puderas tu, menina,
Ser agora o meu amor,
Já que amar-te é minha sina.
Quarta-feira, uma rosa,
Por ser a flor desmaiada;
Nossa amizade, menina,
É firme, nunca se acaba.
Quinta-feira, uma açucena,
Por ser a flor excelente;
Não sei se fala verdade
Ou se a menina me mente.
Sexta-feira é um trevo,
Que anda rentinho do chão,
Bem puderas tu, menina,
Andar em meu coração.
Sábado é um rosmaninho,
Por ser a flor mais alegre:
Nossa amizade, menina,
É fiel e nunca se perde.
Quem me dera cá domingo,
Dia de tanta alegria!
O meu gosto é ir buscar-te
Para a minha companhia!
b.
Na segunda eu me deito
E na terça me levanto;
Na quarta é da santo;
Na quinta vou para a feira;
Na sexta vou ver a leira;
Sábado, vou passear
E, no domingo, missar.
Diga-me agora, comadre,
Quando hei-de descansar!
c.
Não há sábado sem sol
Nem há domingo sem missa,
Nem segunda sem perguiça,
Nem terça sem haver feira,
Nem convento se ter freira
Não há menina bonita
Sem ter vestido de chita.

Aos meses
Eu sou o Janeiro
Que espalho o meu grão
E peço a Deus
Aceso tição.
Eu sou o Fevereiro,
Mês dos temporais,
Descubro as casas,
Derrubo os portais
E eu sou o Março
Que sempre marcejo
E farto as terras
De água e desejo.
E eu sou o Abril,
O tempo das flores,
Gorjeiam as aves,
Despertam amores.
E e sou o Maio
De pouca ventura,
Jã não tenho grão
Nem tenho assadura.
E eu sou o Junho,
Já não tenho nada:
Só mato a fome
Com pão de cevada.
E eu sou o Julho,
O mês mais sisudo,
Que farto cidades,
Aldeias e tudo.
Eu sou o Agosto,
Que toco guitarra
E que vendo o vinho
A meia canada.
Eu sou o Setembro
Que tudo recolho:
O trigo, o milho,
O grão e o restolho.
Eu sou o Outubro,
O Mês do Outono,
Estrumo as terras
Para bem do dono.
Eu sou o Novembro,
O mês dos santinhos,
Em que os lavradores
Provam os seus vinhos.
Eu sou o Dezembro
Engordo o meu porco
Como os meus torresmos,
Regalo o meu corpo.
Trinta dias tem Novembro,
Abril e Junho e Setembro;
De vinte e oito só há um,
Tudo o mais tem trinta e um.

Às vogais
a.
A mãezinha leva já – á
O leitinho com café – é
Prá merenda da Lili – i
Que está na casa da avó – ó
A brincar com a Lulu – u
A – E – I – O – U
b.
Sor polícia venha cá – á
Venha ver o que isto é – é
O barulho é aqui – i
O neto bateu na avó – ó
Deu-lhe um pontapé no cu – u.
c.
Eu conheço a letra á
Onde quer que a veja escrita,
Junto-lhe um pê, fica pá
Oh, que letra tão bonita!
E também conheço o é,
Até o sei escrever;
Junto-lhe pê, fica pé,
É muito fácil de ler.
Conheço também o i,
É uma bonita letra,
E até a sei desenhar:
Tem uma pintinha preta.
A letra ó, redondinha.
É bem fácil de escrever:
Até a mina maninha
Dorme, ao ouvi-la dizer.
E a letra u, é, enfim,
Das vogais a derradeira,
Faz lembrar uvas maduras,
Penduradas na videira.

Aos números
a.
Um, dois, três,
Macaquinho do chinês.
b.
Um, dois, três, quatro,
A galinha e o pato
Fugiram da capoeira;
Atrás foi a cozinheira,
Que lhes deu com um chanato:
Um, dois, três, quatro!
c.
A galinha da pousada
Põe os ovos à manada:
Lá põe um e lá põe dois,
Lá põe três e lá põe quatro,
Lá põe cinco e lá põe seis,
Lá põe sete e lá põe oito,
Lá põe nove e lá põe dez.
Um, dois, três, quatro, cinco,
Seis, sete, oito, nove, dez!
d.
Pus-me a contar às avessas
As pedras duma coluna:
Dez, nove, oito, sete, seis,
Cinco, quatro, três, duas, uma.
e.
Quem ganha um e gasta dois
Nada tem para depois;
Quem ganha dois e gasta três
Nada tem pra outra vez;
Quem ganha três e gasta quatro
Escusa de bolsa e saco;
Quem ganha quatro e gasta cinco
Tem de andar sempre faminto;
Quem ganha cinco e gasta seis
Nunca juntará dez reis
Quem ganha seis e gasta sete
Não sabe no que se mete;
Quem ganha sete e gasta oito
Nunca pode andar afoito;
Quem ganha oito e gasta nove
De rico torna-se pobre;
Quem ganha nove e gasta dez
Perde os sapatos dos pés.
f.
Quatro com cinco são nove,
Para doze faltam três;
Se te faltei algum dia
Aqui me tens outra vez.
g.
Doze e redoze,
Com mais quatro são catorze,
Com mais sete vinte e um
Faz a conta menos um.
h.
Doze e redoze,
Vinte e quatro e catorze,
Desasseis e vinte e um
Dão um cento, menos um.
i.
Cifra vai,
Cifra vem,
Toma lá dez reis,
Bota cá um vintém
E volta pró ano,
Porque eu pago bem.
j.
Três vezes nove vinte e sete,
Quem não pode não promete.
Quem morreu foi o Baeta
À porta da Castanheta.
Temas vários
Arco-da-velha
Põe-te na quelha
Fita Vermelha
Não é para velha.
––
Arco-da-velha
Não bebas aí
Burros e burras
Mijaram aí.
––
O tempo pergunta ao tempo
Quanto tempo o tempo tem;
O tempo responde ao tempo
Que o tempo tem tanto tempo
Quanto temo o tempo tem.
––
Ó solzinho, vem, vem,
Ganharás um vintém;
Se vieres pelo telhado
Ganharás um cruzado.
––
Rei, capitão,
Soldado, ladrão,
Orelhas de gato
Focinho de cão.
––
Sapateiro, remendeiro,
Come tripas de carneiro:
Bem lavadas, mal lavadas
Tudo vai para o pandeiro!
––
Quem parte e reparte
E não fica com a maior parte,
Ou é tolo ou não sabe da arte.
––
O pretinho dà Guiné
Lava a cara com café
Tem vergonha de ir à missa
Com sapatos de cortiça.
––
Chi-chi-ri-chi… onde vais, velha?
Chi-chi-ri-chi… vou para a serra
Chi-chi-ri-chi… que vais fazer?
Chi-chi-ri-chi… vou buscar lenha
Chi-chi-ri-chi… pra que é a lenha?
Chi-chi-ri-chi… pracender o lume.
Chi-chi-ri-chi… pra que é o lume?
Chi-chi-ri-chi… pra fazer o caldo
Chi-chi-ri-chi… pra que é o caldo?
Chi-chi-ri-chi… pra dar ao moço
Chi-chi-ri-chi… pra que é o moço?
Chi-chi-ri-chi… pra sachar milho
Chi-chi-ri-chi… pra que é o milho?
Chi-chi-ri-chi… é prás galinhas
Chi-chi-ri-chi… pra que são as galinhas?
Chi-chi-ri-chi… pra pôr os ovsos
Chi-chi-ri-chi… pra que são os ovos?
Chi-chi-ri-chi… pra dar ao padre.
Chi-chi-ri-chi… pra que é o padre?
Chi-chi-ri-chi… pra dizer a missa.
Chi-chi-ri-chi… pra que é a missa?
Chi-chi-ri-chi… pra ir pró céu da carriça.
__
Chi-chi-ri-chi… casou Maria
Chi-chi-ri-chi… com quem seria?
Chi-chi-ri-chi… C’um sapateiro
Chi-chi-ri-chi… que lhe daria?
Chi-chi-ri-chi… umas chinelas
Chi-chi-ri-chi… de que são elas?
Chi-chi-ri-chi… de cordovão
Chi-chi-ri-chi… casou João.
__
Cá-cá-rá-cá… põe-te na pá,
Faz um bolinho pró meu manquinho.
– Quem o mancou?
– Foi a pedra.
– Que é da pedra?
– Está no monte.
– Que é do monte?
– O lume queimou-o.
– Que é do lume?
– A água apagou-o.
– Que é da água?
– Os patos beberam-na.
– Que é dos patos?
– Estão a pôr ovos.
– Que é dos ovos?
– Os padres comeram-nos.
– Que é dos padres?
– Estão a dizer miss.
– Que é da missa?
– Já está dita.
––
Cá-cá-rá-cá… põe-te na pá,
Faz um bolinho pró meu manquinho.
– Quem o mancou?
-Foi uma velha que aqui passou.
– Que é da velha?
– Caíu à água.
– Que é da água?
– Beberam-na os bois.
– Que é dos bois?
– Foram semear trigo.
– Que é do trigo?
– Comeram-no as pitas.
– Que é das pitas?
– Foram pôr o ovo.
– Que é do ovo?
– Comeram-no os padres.
– Que é dos padres?
– Foram dizer missa.
– Por quem é a missa?
– É pela carriça.
Era uma velha que tinha um gato
Era uma velha que tinha um gato
Debaixo da cama o tinha.
O gato miava e a velha dizia:
– Mal haja o teu miar
Que não me deixa dormir
Nem tão pouco descansar.
Era uma velha que tinha um cão
E debaixo da cama o tinha
O cão ladrava, o gato miava
E a velha dizia:
– Mal haja o teu ladrar e o teu miar
Que não me deixam dormir
Nem tão pouco descansar.
Era uma velha que tinha um galo
Debaixo da cama o tinha.
O galo cantava, o cão ladrava,
O gato miava e a velha dizia:
– Mal haja o teu cantar,
O teu ladrar, o teu miar
Que não me deixam dormir
Nem tão pouco descansar.
Era uma velha que tinha um porco
E debaixo da cama o tinha.
O porco roncava, o galo cantava,
O cão ladrava, o gato miava
E a velha dizia:
– Mal haja o teu roncar, o teu cantar,
O teu ladrar e o teu miar
Que não me deixam dormir
Nem tão pouco descansar.
Era uma velha que tinha um burro
Debaixo da cama o tinha.
O burro rinchava, o porco roncava,
O galo cantava, o cão ladrava,
O gato miava e a velha dizia:
– Mal haja o teu rinchar,
O teu roncar, o teu cantar,
O teu ladrar e o teu miar
Que não me deixam dormir
Nem tão pouco descansar.
Era uma velha que tinha um boi
Debaixo da cama o tinha.
O boi berrava, o burro rinchava,
O porco roncava, o galo cantava,
O cão ladrava, o gato miava
E a velha dizia:
– Mal haja o teu rinchar,
O teu roncar, o teu cantar,
O teu ladrar e o teu miar
Que não me deixam dormir
Nem tão pouco descansar.
A velha, obrigada, então,
Tomou esta decisão:
Mata o boi, e mata o burro,
Mata o porco, e mata o galo,
Mata o cão, e mata o gato…
E, satisfeita, dizia:
– Acabou-se o teu berrar,
Acabou-se o teu rinchar,
Acabou-se o teu roncar,
Acabou-se o teu cantar,
Acabou-se o teu ladrar,
Acabou-se o teu miar…
Agora posso dormir!
Também posso descansar!
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